domingo, março 31, 2013

Não precisa de ser às quartas-feiras como no filme de Patrice Chéreau mas o silêncio é uma possibilidade. Sem palavras, que são tantas afinal, e com corpos, tão poucos, será difícil (será? pergunto ao Ovídeo mas ele não responde) deitar a perder algo tão delicado e raro.  Entretanto os dias somam-se uns aos outros sem que tenhamos tempo de pestanejar e fazer balanços no final da noite, se os há nalguns dias entre estações fazem-se as pazes por momentos com a humanidade e desculpa-se ao universo a deus ter-nos deixado aqui para morrer. Com ou sem esperança trouxeste-me até aqui.

terça-feira, março 26, 2013

Dói-me o peito, um bocadinho. Por causa desta humidade que não acaba ou por não conseguir escrever-te uma carta. Estou à procura da melhor forma de te apresentar um plano. Não sei se um plano é melhor do que plano nenhum e poesia e esquecimento. Dói-me um pouco o peito porque o corpo teima em contrariar, sem lhe pedirmos sem o autorizarmos, a vontade ou a velocidade das ideias. Talvez deva fumar menos.

segunda-feira, março 18, 2013

A cidade está coberta de pobres e de flores também. São discretas nas pequenas árvores. Vejo-as, como todas as palavras ou signos, como a luz cinza deste inverno, vejo-as e é uma cidade diferente. Ou porque cheguei de novo a uma das muitas cidades dentro dela ou porque estás em quase todos os meus caminhos. E por isso aquele amontoar de nuvens naquela direcção, por cima daquela árvore e através daquele pedaço de janela, não é o mesmo amontoar de nuvens que nos devolve a escala de nós mesmos, perdida se caminharmos só por pedras da calçada. O amontoar daquelas nuvens naquele pedaço de céu que não premeditámos ver, mas que se colocou ali onde o olhar súbito apontou, inquieta-nos. Como se o movimento pesado deste corpo de nuvens brancas e cinzentas pudesse anunciar um drama maior. Podemos ver as flores, podemos ver os pobres.

quarta-feira, março 06, 2013

Talvez a chuva e o vento não tenham deixado o presente chegar. Mas sobrevivemos a temporais antes. Continuo a pensar na montanha, menos, a cidade nunca nos desocupa. Mesmo com sinos a dar-nos algumas horas do dia. Demoliram uma casa com cerca de 150 anos ao pé de nós. Em duas semanas. Quantas gerações cabem em 150 anos? Hoje retiraram um cadáver de alguém com perto de 90 anos de uma casa, o aparato na avenida foi tão grande que a morte solitária acabou por dar tanto nas vistas.

domingo, março 03, 2013

Flor do inverno

Tens de caminhar, ao anoitecer, junto ao muro do jardim da marquês sá da bandeira a chegar a marquês da fronteira. Tem de ser por estes dias. Tudo o mais pode esperar. Se ela caminhar junto ao muro do jardim, ao anoitecer, por estes dias, não preciso de esperar pela Primavera. Não consigo deixar-te as camélias que tenho aqui. E sei que precisas, das prendas das flores apesar de estares a ir embora de todos os lugares onde imagino, ou não, ver-te.