terça-feira, dezembro 30, 2003

A casa está vazia. Alguns vasos no parapeito da janela da marquise. Lá fora uma planta deu flores ao fim de vinte anos. Vinte anos depois de fechada na modernidade dos apartamentos suburbanos. A nossa modernidade será fugir para de onde os nossos pais fugiram em busca dela.

A nossa modernidade terá acabado nesta cidade grávida de espectáculo. Quando continuam a ereger torres no alto das colinas, no alto de outras torres, se não vierem aviões elas cairão sozinhas sobre o rio. A paisagem linda da janela nos dai hoje enquanto vivemos com as bombas dos outros com os terramotos dos outros com a morte dos outros.

quinta-feira, dezembro 18, 2003

Audiência/ Vernissage/
Apresentadas pela primeira vez em Portugal, as peças giram em torno dos direitos humanos, da liberdade e da inquietude em busca de novos ideais. De 5 a 28 de Dezembro no Teatro Nacional D. Maria II, em Lisboa.
PUBLICO.PT

ACTORES
António Banha, Júlio Martin, Maria Amélia Matta, falta aqui1
AUTOR
Václav Havel, ex-presidente da República Checa
CENÓGRAFA Joana Matos ENCENADOR Jorge Listopad

dois textos que são um só apropriados para tempos que correm.
Se bem que é provável que não toquem em quem deviam tocar, estamos em anestesia dura, por isso as estantes em mogno ou a tão esperada ida a uma praia paradisíaca acabem por toldar a vista e são sempre um lugar mais seguro que este onde vivemos.
nem tudo boas interpretações, nem todas as escolhas de meios satisfatórias para o despojamento ou a simplicidade cénica que parece ser impossível no nacional.
um texto ou dramaturgia que podia ter desenvolvido mais os aspectos psicológicos das personagens e da situação(em que cairam? optaram?) com excepção para a do escritor (o próprio václav havel?)


segunda-feira, dezembro 15, 2003

A universidade aberta ao mundo e à vida numa relação que lhe justifica o nome de universal(idade=universidade) Este nome parece ir ficando cada vez mais distante daquilo que nomeia. Quem quiser ir, em qualquer momento da sua vida, frequentar um curso superior, sabe que o Estado não perde tempo nem dinheiro com presunções egoístas dos cidadãos que querem investir na sua formação. As aulas em regime pós-laboral foram sendo diminuidas progressivamente em cada instituição de ensino, em vez delas surgiu um regime de prescrições para impedir que as pessoas se demorem mais do que o razoável a terminar uma licenciatura, cada vez mais cara ao bolsos dos que a frequentam, cada vez mais barata para o Estado. Ou seja, para aqueles que têm de sustentar a sua vida e os seus estudos tornou-se impossível os estudos serem seus.
Para a machadada final-Lei da Autonomia-foi espalhada a ideia falsa de que os estudantes que participam nos órgãos das universidades discutem os ordenados e carreiras dos docentes, depois a ideia de que atrapalham porque estão de passagem e não chegam a dominar nunca os assuntos tratados, para chegarmos a propostas como as do PS e PSD que defendem uma diminuição do poder e participação de estudantes, quando na actualidade os estudantes já estão em minoria porque nunca detêm os cargos de presidência que tem voto de qualidade em situações de empate (o que raramente acontece porque nem estudantes nem docentes nem funcionários se comportam coorporativamente por sistema) Isto é passar um atestado de incompetência pedagógica, polí­tica e cidadã  àqueles que ao longo das últimas décadas têm dentro da universidade sido os únicos(quase sempre) de uma forma continuada a defender mais do que os seus interesses particulares. São os estudantes que querem bons professores, boas bibliotecas, um ensino de qualidade e são agora os docentes que não querem estes estudantes. Obviamente que não são todos os professores, aliás, quem tem por hábito passar atestados de incompetência aos outros é quem confia pouco nas suas próprias capacidades, como os professores que dizem nunca ter dado um 18 na vida. Pudera, dificilmente saberiam reconhecê-lo.
Também aqui se fecha a universidade, os cadeados não são nada comparado com isto. Eles deviam permanecer nas portas. Para que queremos nós estas universidades abertas?

terça-feira, dezembro 09, 2003

Pacto de Estabilidade
A rádio vox é do Nobre Guedes do PP, que, como detém mais quatro rádios regionais ultrapassa em uma o limite imposto por lei para a detenção destes órgãos de comunicação. Existem leis contra o monopólio dos meios de comunicação social apesar de insuficientes. Recentemente os partidos no governo chumbaram propostas nesse sentido. Os monopólios emergentes esclarecem o porquê deste chumbo e esclarecidos também ficamos em relação aos textos lidos na rádio vox, uma selecção dos melhores artigos direitó-popularuchos escritos na imprensa. Há fretes que a música alternativa não devia suportar. Será que não haverá gente no Partido Popular que queira financiar a falida Zero em Comportamento?

quinta-feira, dezembro 04, 2003

Algo se passa em Bragança de terrífico. Primeiro são as mulheres de lá a querer culpar mulheres estrangeiras pela infidelidade dos maridos, agora é uma associação de pais a querer impedir uma turma constituída maioritariamente por ciganos de vir para a sua escola. Bragança devia receber um galardão por mãos do ministro da defesa de quem ninguém nos defende. Quem nos defenderá das pessoas de Bragança agora?

Infelizmente as associações de pais, nas escolas que felizmente as têm, servem fundamentalmente para isto, ou melhor, estão activas quando se trata de averiguar que os seus filhos não são expostos ao contágio dos meninos "problemáticos" esquecendo-se que contagiam os próprios filhos de ideias racistas e essas são mais perigosas que um murro no recreio do mauzão da escola.

quarta-feira, dezembro 03, 2003

Nenhum dia é um dia se é só para ti
e ainda que seja para todos
Ninguém o prende porque não é compacto
nem está preso a uma coluna ou a um poste
O dia passa e nós não vemos o seu espelho de cinzas
mas dele vai ficando o que não fica
Um dia nunca é o teu dia nem o dia que se segue
a outro dia e que por outro dia será seguido
O tempo caminha para si mesmo num cículo perene
e todas as suas sequências formam o zero absoluto
Ele é a eternidade no seu espaço de ausência
e a finitude de cada momento num entrançado indiscernível
ao qual ninguém pode arrancar um pedaço de tempo
É vão nós numerarmos as horas e os minutos
porque o tempo flui alheio às nossas vidas
com a sua roda abstracta em torno de si mesmo
Nós estamos assim presos nesta armadilha metafísica
que sobreviverá eternamente como se nada se passasse
na sua armação monótona e incessante


António Ramos Rosa